segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Trás a pena

Pesa-me o cansaço, o sono, tudo perante uma tão comum e igual revelação da vida perante mim.
Trata-se de sentir o que não temos, sentir o que já tivemos,
sentir a podridão da vida desgatada evaporar-se em papel queimado.
Trás-me a saudade de não sentir o que não é, revezar o que sinto por não ter que sentir.
Dói sentir o que quero, não aspirar mais do que fui,
triste país de mortos andaimes, mulas e machos de olhos tapados,
andam em recta de olhos destapados a medo de não se desviarem do seu caminho mijado.

Resta-te a ti tal como a mim ficar a vê-los passar e com cuidado não pisar o rasto que deixam, não se ofendam as bestas por pisarmos seus restos.

Fomos heróis, agora envergonhados estamos por aqui,
sem sonhos,
sentados a recontar as migalhas e distribuí-las pequenez a pequenez,
uma a uma por cada refeição, enganando a fome, que alimenta o farto querer de quem pode o poder todo sem dever,
ficamos assim todos a ver o que cada besta fez.

Ah tristeza a nossa do pobre português tão acostumado a consentir, larga agora os sonhos encolhendo os ombros, atravessa o areal num triste nevoeiro,
não sonha, não lembra, quem pode vir
ficou para trás seu quinto império.
Um dia mais tarde contamos as migalhas e olhamos atrás
e vimos que não percorremos mais que o império das Bestas.

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