terça-feira, 26 de abril de 2011

Rimar é irritante

Homem culto, trabalhador, experiente, sempre desejou coisas boas aos outros e até a si mesmo, sempre teve boas ideias, nunca brilhantes, mas ideias.
Desejava muito ao mundo, mas a si queria o maior e menos possível dos quereres. Homem rico de espírito e de sonhos louvado, queria humildemente ter um livro seu, da sua mão, do interior rebuscado, todo ele escrito numa deliciosa prosa simples e formosa, mas o pobre sofria de uma contrária e secreta vontade.
As ideias etéreas, mais singulares no universo saem em verso e ele entristecia porque desta grave doença padecia. Escrever o sentimento em triste rima ah isso ele não queria.
Rimar, que coisa horrível de criar, ele dizia, limitam, irritam e fazem pobre a frase que era viva.
Triste e irritado de si para si se ordenou a não escrever, os cadernos em velhas estantes abandonados por lá ficaram esquecidos devido ao homem vencido, nunca mais foram reclamados por alguém que os pudesse ler.
A pouco e pouco esse velho se desenRimou
e a contra gosto o seu corpo o abandonou.
Ignoradas obras, sonetos e livros,
muito cedo a sua alma evaporou.
Lá foi o velho à outra vida sem seus amarelos manuscritos.
Talvez um Camões ou Pessoa melhorado,
deu a vez à teimosia e morreu resignado.
Não foi prosa que ele deixou,
não foi a formosa que amou,
foram os mais belos poemas o seu legado.

Assim foi um destino pela poesia interior traçado,
parelhas de rimas irritantes em versos encadeados,
para sempre esquecidos
para sempre ignorados.

Tudo pela teimosia.
Vontade de rimar.

segunda-feira, 18 de abril de 2011

Outros dois

Olá?
Uma pessoa que não conheço cumprimenta-me.
Pelo que foi em tempos, revela-se um cumprimento de alguém que talvez me conheça, talvez eu a tenha conhecido...Um género de olá, dito e oferecido sem valor a alguém que não sabemos realmente quem seja.
As décadas foram rápidas a passar, e os anos passam como segundos em vida de quem vive o dia a dia e não olha para trás, os séculos tornam-se diariamente coisa passageira , as lembranças escapam-se por entre os dedos que mal fazem esforço por as agarrar.
A pessoa que me cumprimentou conhece-me tão bem como eu a conheço a ela, também ela sonda o seu passado e revela uma inexactidão sobre não saber quem foi.
Em demorado olhar entrelaçado, estes dois que aqui se encontram não choram,
pois não sentem saudades,
não sorriem,
pois não se reconhecem,
não se odeiam nem se amam,
pois já se esqueceram.

Eu retribuo um inocente olá, agora embaraçado tal como ela. Estrangeiros de nós mesmos, estamos é claro cientes e embaraçados de um dia nos termos conhecido, mas hoje, depois de tantos séculos passados ignoramos quem fomos, sem pena do que foi.
O embaraço foi simples,
e de ombros agora erguidos
corremos em seguida a rua
cada um para o seu lado esquecidos.

Não tem grande importância para estes dois.
Não se odeiam nem se amam,
são hoje outros estes dois.
Já se esqueceram.


quarta-feira, 13 de abril de 2011

Vergonha?

Tenho vergonha. Tenho mesmo vergonha.
Olho para trás e nestes anos o tão pouco que se passou fez-me rever o que fui num distante e enevoado de vergonha.
Talvez como será daqui a outros poucos anos.
Irei viver a vida em constante vergonha de mim?
Esquecendo-me e ignorando-me?
Deveria ser em constante crescendo, a evolução da vida para um dia não ter pena do que fui, mas ahhh, será só mais um delicioso e mórbido viver cada vez mais evoluído, todo ele um futuro, construindo e aperfeiçoando uma nova e melhor vergonha.
Vivemos para a vergonha, vindos da vergonha, olhamos para trás e gritamos sempre algo não diferente de isto:
"OH GLORIOSA vergonha que fui, que fiz o que não faço, que vestia o que não visto, que vivia o que não vivo, que era o que não sou."
Ah cérebro evoluído seu maroto assacanado, obrigas-me a esquecer para não ter vergonha?
Uma autodefesa de nós mesmos?
Pois envergonha-me o esquecer, não lembrar, não reviver enfurece-me, não recuperar tempos perdidos.
Para que procuramos em eterna demanda perdida nas mais antigas das velhas filosofias da Grécia antiga até aos modernos e aborrecidos dias de hoje, um tão alto significado tão nobre para essa gloriosa e épica Raizon d'être, se na verdade somos cães, gatos e porcos ou outros demais animais que sofrem a existência de se fazerem e desfazerem em questões?
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Mas de animais além da questão não somos mais do que bichos sedentos da sua refeição, do sexo alcançado, do verdadeiro prazer, de dormir em longas sestas e outras coisas mais, mas sempre com um certo medo de morrer!

Atrás de nós temos um esquecimento puro, já mais próximo arrastamos a velha e sempre presente conhecida vergonha, enquanto que enfardando no presente nossos sentidos afogados em orgias de prazer nos cegam o futuro.
Só não somos porcos e galinhas porque temos vergonha do ontem, não o somos porque nos perguntamos constantemente, Serei porco? Ou Galinha?
Somos humanos, porcos cheios de questões e cheios de vergonha.
Pois eu faço questão de ser porco, sem vergonha ou outras questões vinculadas.
Até porque ouvi dizer que tais animais têm orgasmos longos de quinze ou mais minutos.
Ah...
Aposto que amanhã ou para a semana vou ter vergonha de tudo isto.
Isto é, se não me tiver esquecido.

sem mais folhas para escrever

Quantas vezes.
Quantas vezes pergunto,
quantas foram as oportunidades perdidas?
Outros que não eu?

Quantas vezes?
Te abriste a mim, para receber,
eu te arranhar e contar.
Escrever na tua pele os mais belos poemas,
tão longos e esquecidos, tão lúcidos e por si iludidos
(principalmente pelo esquecimento).
Companhia constante para mim,
que de presente não aceite, acabaste por ficar
a ouvir-me até ao fim.

Que será de ti depois?
Quando os folheados acabarem, as capas se rasgarem e os bichos as triturarem...
Que será dos versos, das lágrimas, das folhas arrancadas,
desenhos ou lembranças e as consultas privadas de psicólogo?
Que será quando eu já não souber o que fui, que escrevi e reli?

Serás, Velho Caderno uma linha solta no destino que tal como eu desaparecerá sem que alguém se importe ou faça caso de recoser.
Queimarás mais tarde ou cedo, como eu.
Ficarás esquecido, tanto como eu.
Mas não faz mal, as pessoas são linhas soltas que se perdem umas nas outras sem se importarem de onde os outros vêm e vão, o que importa é de si para si.
Consola-te. Deite vida.
Não tanta como tu a mim, é certo.
Mas agora que és vida, pessoa, ser, linha solta no destino, resta-te enfrentar os dias até ao fim.
Quando as folhas acabarem e fores fechado, tu selado serás perdido e esquecido.
Tal como as pessoas essas que têm vida serás esquecido.
Foi o meu presente para ti.
Tu que eras um presente que não era para mim.


sábado, 9 de abril de 2011

São coisas tão simples.
Por vezes os mais simples dos dizeres não passam pelas mais simples palavras.
Estragam tanto o resto existente porque não entendem que a vida é uma simples linha,
uma recta linear e submersa a quem ninguém interessa,
simples,
cheia de ausencia de palavras,
cheia de frases perdidas,
recheada de condições contrárias e certas,
tão certas como irreais.

São simples coisas.
Coisas simples que se prendem,
não entendes,
nunca vais entender.

Um dia irás perceber que o simples
de todas as razões pertence ao mais simples dos
seres.
E tu como todos os outros nunca vão ver.
Porque tu tal como todos os outros vão estar iludidos pelos
receios de se compreenderem.

Escapa ao humano a vontade de se entender.
E tu,
sim tu,
nunca o irás querer.

E se um dia,
oh, estás mais longe de todos os outros como alguem já esteve.
Não irás voltar,
ninguém sentira tua falta ou tu saudades.
Serás algo mais que o que foste.
Um sujeito longe de si.
Serás alguém que não tu.
Vais ser a própria ausência de ti.